A não incidência do ISS sobre atividade de franquia

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FRANQUIAS

A não incidência do ISS sobre atividade de franquia

A briga entre franquias (de qualquer natureza) e os Fiscos municipais está longe do fim. Atualmente em repercussão geral (Tema 300), os contribuintes aguardam a tão esperada decisão do Supremo tribunal Federal (STF) sobre o assunto.

São inúmeras as decisões favoráveis aos contribuintes no sentido de que não incide Imposto Sobre Serviços (ISS) em contrato de franquia. A discussão principal nos Tribunais abarca a cobrança de ISS cobrado em cima dos royalties pagos pelas franquias.

Isso porque, o royalty não caracteriza uma prestação de serviço, mas sim uma taxa que dá o direito ao franqueado (lojista) de usar o nome e a experiência da franquia (rede), não sendo possível, então, a incidência do ISS.

O Sistema de Franquia é definido pela lei 8.955 de 1994 como a relação onde o franqueador concede ao franqueado o uso de direitos de propriedade intelectual associado à distribuição/compra e venda de bens e prestação de serviços.

A própria definição de franquia prescrita no artigo 2º, da Lei Federal nº 8.955/94[1], confirma que se trata de um contrato típico e complexo de cessão de direitos, que estipula uma série de direitos e deveres às partes contraentes, dentre eles, obrigações de dar, de fazer e de não fazer, e que, em razão disso, não pode inserir-se dentro do conceito de serviço.

O impacto tributário para o contribuinte é deveras significativo!

A alíquota do imposto (ISS) sofre variação de 2% a 5%, entre os municípios do Brasil, sobre o valor do serviço prestado. No caso da atividade de franquia no município de São Paulo, por exemplo, se um franqueado paga R$ 1.000 de royalties, a franquia precisa recolher aos cofres municipais mais R$ 50 de ISS.

A cobrança é motivada em decorrência da previsão legal contida na Lei Complementar (LC) nº 116 de 31 de julho de 2003, que veiculou nova lista de serviços tributáveis pelo ISS, incluindo a franquia (franchising) – item 17.08 – como serviços sujeitos à incidência do imposto municipal.

Com isso, a LC nº 116/2003 teria, expressamente, autorizado os Municípios e o Distrito Federal a tributarem o franqueamento e suas atividades-meio. Com a edição da referida lei, todos os Municípios brasileiros passaram, então, a editarem suas próprias Leis, contemplando a atividade de franquia como passível de incidência do ISS.

A nossa Constituição Federal, atribuiu aos Municípios a competência para instituir “imposto sobre serviços de qualquer natureza” (ISS), conforme artigo 156, inciso III de seu Texto:

“Art. 156 – Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no artigo 155, II, definidos em lei complementar.”

 

Ao outorgar competências, estabelece a própria Constituição, de forma objetiva, rígida e exaustiva, sobre quais fatos poderão incidir os tributos exatamente para que não haja invasão de uma sobre a competência de outra pessoa política.

Todavia, dando a Constituição Federal competência aos Municípios para instituírem impostos sobre “serviços”, somente sobre o que se considerar efetivamente um serviço, poderá ocorrer a incidência do referido imposto. Ou seja, o fato de constar “franquia” na lista de serviços das leis Municipais não significa que estamos diante de uma prestação de serviço ou serviço de qualquer natureza.

Doutrinariamente há um consenso no sentido de que prestar serviço implica realizar Obrigação de Fazer, o que diferencia o ISS do fato gerador do ICMS, uma vez que este imposto, na parte relativa à comercialização de mercadorias, pressupõe a realização de típica Obrigação de Dar.

Tal posicionamento se coaduna com o entendimento já consignado pelo Superior Tribunal de Justiça e demais Tribunais Pátrios, no sentido de não se tratar, o contrato de franquia, de simples prestação de serviço, cuidando-se de contrato de natureza complexa.

A atividade de franquia caracteriza-se, portanto, como uma cessão de direitos que, sendo um negócio jurídico, não se configura como “prestação de serviço” na estrita acepção dada pelo Texto Constitucional, e, por isso, não pode ser tributada pelo ISS, como bem reconheceu os Tribunais de todo o país.

Destacamos que o tema já foi julgado pelo Superior tribunal de Justiça, sob o rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil, onde o entendimento foi firmado no sentido de não caracterizar o contrato de franquia uma prestação de serviços, razão pela qual não se sujeita ao ISS. São esses os termos das ementas abaixo transcritas:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ISS. FRANQUIA (FRANCHISING ). NATUREZA JURÍDICA HÍBRIDA (PLEXO INDISSOCIÁVEL DE OBRIGAÇÕES DE DAR, DE FAZER E DE NÃO FAZER). PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. CONCEITO PRESSUPOSTO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. AMPLIAÇÃO DO CONCEITO QUE EXTRAVASA O ÂMBITO DA VIOLAÇÃO DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL PARA INFIRMAR A PRÓPRIA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA CONSTITUCIONAL. INCOMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. [2]

 

Em determinado trecho do acórdão, o relator obtempera que “a mera inserção da operação de franquia no rol de serviços constantes da lista anexa à Lei Complementar 116/2003 não possui o condão de transmudar a natureza jurídica complexa do instituto, composto por um plexo indissociável de obrigações de dar, de fazer e de não fazer.”

Atualmente, duas ações de grande importância tramitam no STF!

O Recurso Extraordinário 603.136, de autoria da Venbo Comercial de Alimentos (da rede de restaurantes Bob’s), discute a incidência do ISS sobre os royalties pagos pelo franqueado. Neste caso, a Procuradoria-Geral da República (PRG) apresentou um parecer no qual sustenta que a natureza híbrida do contrato de franquia não afastaria a incidência do ISS.

E a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.784/DF, proposta pela Associação Nacional das Franquias Postais do Brasil (Anafpost), em maio de 2012, objetiva afastar a incidência do imposto sobre a remuneração recebida pelas agências franqueadas dos Correios em decorrência do contrato de franquia firmado entre as franqueadas e a ECT – Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Aqui, o parecer da PRG requer a declaração de inconstitucionalidade da cobrança de ISS sobre os contratos de franquia empresarial.

Destarte, revela-se inarredável que a operação de franquia não constitui prestação de serviço (obrigação de fazer), escapando, portanto, da esfera da tributação do ISS pelos municípios.

Concluímos que a legislação (LC 116/03) é inconstitucional e ilegal, no que tange à inserção do item 17.08 na lista de serviços passíveis de tributação, já que pretende a incidência do ISS sobre o que não é verdadeiro serviço nos limites da Constituição Federal.

Ocorre que, enquanto uma decisão definitiva acerca da constitucionalidade não é proferida, no presente momento, o ISS permanece incidente no pagamento de franchising e o simples não recolhimento pode ser considerado sonegação fiscal. Mesmo diante de uma possível declaração de inconstitucionalidade, o contribuinte ainda ficaria à mercê da modulação de efeitos pelo Supremo.

Portanto, para garantir seu direito, os contribuintes que entendem pela não incidência do ISS sobre a atividade/contrato de franquia, deverão ingressar com a respectiva ação judicial, pleiteando afastar essa tributação.

Sendo o que tínhamos para o momento, ficamos à disposição para maiores esclarecimentos, se necessários.

Helena Vicentini de Assis, Coordenadora do Contencioso Tributário do Molina Advogados

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[1] “Artigo 2º – Franquia empresarial é o sistema pelo qual um franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos e serviços e, eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta, ou indireta sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício”

[2] REsp nº 963512/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, j. 28/04/2008, DJ 27/05/2009

Uma resposta para “A não incidência do ISS sobre atividade de franquia”

  1. Boa Noite!

    Em relação a documentação comprobatória para o pagamento dos Royalties, como seria !? Como ele compõe o Valor do produto por exemplo, seria emitido uma NF… Como o Franqueado justifica o pagamento de Royalties, somente com o boleto pago em caso de Inventários, Auditorias … Etc ?

    Antecipadamente fico grato pela atenção…

    Respeitosamente,

    Luan Vitor

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