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Situação comum: o sujeito retira-se de determinada sociedade empresarial na qual exercia cargo de direção, gerência ou ainda, configurava apenas como sócio e, posteriormente, de súbito, se depara no polo passivo de Execução Fiscal, ajuizada contra aquela Pessoa Jurídica que possuía vínculo.
Este cenário é denominado de “redirecionamento da Execução Fiscal”, instituto originado por meio de requerimento da Fazenda Pública, motivado, muitas vezes, pela presunção da empresa ter cessado suas atividades de forma irregular, sem comunicar aos órgãos competentes sobre seu encerramento.
No artigo de hoje, abordaremos os limites legais desta medida.
Responsabilidade tributária
O termo é utilizado para designar a sujeição passiva indireta de quem não realizou o Fato Gerador, mas, por lei, é obrigado a pagar o tributo. [i]
Existem diversos tipos de Responsabilidade Tributária, sendo que vamos nos ater àquela elencada pelo artigo 135, inciso III,[ii] do CTN que dispõe que os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado são, pessoalmente, responsáveis pelos créditos correspondentes às obrigações tributárias, resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.
Em outras palavras, isto significa que, o empresário ou administrador responde inteiramente, com os seus bens pessoais, pelas dívidas tributárias da empresa, caso aja fora da lei e do contrato ou estatuto social. Para tanto, a Fazenda deve demonstrar que houve tais infrações com dolo ou fraude, para então requerer o redirecionamento da Execução Fiscal, não bastando o simples inadimplemento[iii].
Dissolução irregular: exceção à regra
Exceção à regra de demonstração inequívoca de dolo e fraude como requisito para redirecionamento da Execução Fiscal, diz respeito à dissolução irregular da sociedade empresarial, conforme dispõe a Súmula do STJ nº 435: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.
A problemática ocorre pela inobservância, por parte da Fazenda Pública, das alterações no quadro societário constantes da ficha cadastral da pessoa jurídica e o vencimento dos débitos executados, bem como o quadro societário à época do suposto encerramento irregular.
Verifica-se, com frequência, a seguinte hipótese: havendo a renúncia de um cargo de diretoria, com o devido registro na Junta Comercial, passam-se anos até que a Pessoa Jurídica seja autuada pelo Fisco e, ao fim do contencioso administrativo, o débito é ajuizado para cobrança executiva. Neste caso, se a empresa não for localizada para fins de cobrança, ou seja, quando constatada a hipótese de presunção de dissolução irregular, a tendência é de que a Fazenda Pública redirecione a cobrança do débito para a Pessoa Física (ex-diretor).
A injustiça é latente, tendo em vista que o crédito tributário apenas foi constituído com a lavratura do Auto de Infração que, por sua vez, ocorreu em momento posterior àquele na qual houve a gerência do ex-diretor. Ademais, o ex-diretor sequer exercia função na ocasião da dissolução irregular.
Neste sentido, o entendimento tradicional do STJ era, até 2015, de que o pedido de redirecionamento da Execução Fiscal, quando fundado na dissolução irregular da sociedade executada, pressupunha a permanência de determinado sócio na administração da empresa no momento da ocorrência dessa dissolução e, ainda, que este mesmo sócio exercesse cargo de gerência na ocasião do vencimento do tributo.
Todavia, com o advento do julgamento do REsp nº 1.520.257/SP, o STJ alterou seu entendimento, passando a considerar irrelevante se o sócio exercia ou não, no momento do vencimento do débito tributário, a gerência societária.
As consequências disso são, justamente, situações corriqueiras como a supracitada, na qual há o redirecionamento da Execução Fiscal para atingir patrimônio pessoal de sócio-gerente que apenas adquiriu esta qualidade anos antes ou depois da ocorrência do fato gerador, inadimplemento do crédito tributário e dissolução irregular da sociedade empresarial. Verifica-se, mais uma vez, o ativismo judicial expandindo a previsão normativa, criando uma hipótese de responsabilidade objetiva não comportada nos limites do próprio Código Tributário.
Precisamos falar, queremos agir, mas estamos limitados
O redirecionamento da Execução Fiscal para o sócio-gerente da empresa é medida bastante utilizada pelos Fiscos para cobrança de débitos fiscais empresariais diretamente para os sócios da pessoa jurídica. Entretanto, isto só pode ocorrer quando reste demonstrado que o sócio administrador agiu com excesso de poderes, infração à lei ou contra o estatuto/contrato social, ou na hipótese de dissolução irregular da empresa.
Neste último caso, é comum que a Fazenda Pública requeira o redirecionamento dentro da própria Execução Fiscal, através de simples petição, sem verificar se a pessoa incluída no polo passivo estava presente concomitantemente nesses dois momentos: no vencimento do tributo e no momento em que foi constatada a dissolução irregular.
Há quem defenda que o pedido de redirecionamento da Execução Fiscal requeira a aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica (falamos sobre o tema aqui), para possibilitar o contraditório e a ampla defesa dos sócios, acarretando, inclusive, suspensão da Execução. Entretanto, o assunto ainda é muito debatido e não vislumbra posicionamento favorável na jurisprudência.
Por ora, cabe aos operadores do Direto o fomento ao debate sobre o tema e procura por teses bem elaboradas. Quanto àqueles que são prejudicados pelo indevido redirecionamento de Execução Fiscal, resta se informar a respeito das defesas cabíveis.
Equipe Tributária do Molina Advogados
[i] Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se: I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei
[ii]São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
[iii] Súmula n° 430 do STJ: “O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente”.