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Corporate venture virou um termo da moda recentemente. Se trata da operação por meio da qual uma empresa investe em startups, seja diretamente no seu capital social ao adquirir participação societária ou em alguns casos também como um cliente importante dessa startup, incubando e oferecendo mentoria aos empreendedores que desenvolvem o negócio.
Apesar de ser uma iniciativa louvável em termos de estímulo ao empreendedorismo e também um reconhecimento de que as empresas tradicionais necessitam se renovar para atender aos novos padrões de consumo da sociedade e dinâmica de trabalho, nem sempre esse mecanismo é uma solução viável por conta da diferença de objetivos que o empreendedor e a empresa investidora possuem com esse tipo de iniciativa.
Isso ocorre porque geralmente o objetivo do empreendedor é, em algum momento, chegar a um patamar que possibilite a venda da startup a um terceiro e assim chegar a seu evento de saída (exit). Esta é a hipótese em que efetivamente vai adquirir um valor relevante com a ideia que desenvolveu. Esse tipo de pensamento está, em alguma medida, alinhado aos objetivos de um investidor-anjo, venture capitalist ou fundos de private equity e, por isso, essa relação geralmente é mais simples de ser traduzida contratualmente.
De outro lado, geralmente o objetivo da empresa ao realizar um programa de corporate venture é incorporar um novo produto ao seu portfolio. Ou seja, essa empresa não tem o objetivo de fazer a venda da startup no futuro. Da mesma forma, a empresa também não deseja que o empreendedor responsável por aquela startup em que ela está investindo abandone o projeto.
Assim, cria-se uma divergência muitas vezes insuperável entre as duas partes que participam do corporate venture: a empresa e o empreendedor. Logo no início da relação existe uma diferença aparentemente inconciliável entre as partes, já que uma quer permanecer com aquela solução por um tempo indeterminado, enquanto o outro quer realizar seu lucro em um curto período de tempo. Portanto, neste início já é notável a diferença de mindset de uma empresa e uma startup. Uma empresa com 100 anos de história muitas vezes não enxerga a velocidade com que são feitos negócios por startups que possuem um ciclo de vida curto, cuja taxa de mortalidade é de 90%, segundo a Forbes (https://www.forbes.com/sites/neilpatel/2015/01/16/90-of-startups-will-fail-heres-what-you-need-to-know-about-the-10/#335548996679) . No Brasil, para piorar o cenário, 25% das startups fecham as portas dentro de 1 ano de vida, de acordo com a Fundação Dom Cabral (http://www.fdc.org.br/blogespacodialogo/Documents/2014/causas_mortalidade_startups_brasileiras.pdf).
Além da diferença quanto à noção temporal das atividades desenvolvidas por uma empresa e uma startup ainda são adicionadas outras complexidades. Em alguns casos, as startups necessitam se adaptar às políticas de compliance, estruturas de governança, contabilidade e controles internos das grandes empresas. Isso cria custos e engessa a cultura interna da startup de uma forma com a qual estas empresas não estão acostumadas.
Em resumo, existem diferenças gritantes entre os modelos de funcionamento das startups e das empresas que pretendem desenvolver programas de corporate venture. Por essa razão é imprescindível que a empresa mude o seu mindset no momento de investir de alguma maneira em startups.
Assim, essas diferenças passam a influenciar os contratos que pretendem concretizar o corporate venture. Logo na sala de reunião, dispostos a fechar negócio, o empreendedor e a empresa começam a identificar no contrato as dificuldades de realizar este modelo de investimento. Cláusulas como lock up period do empreendedor, tag along e drag along, diluição, direitos de veto, dentre outras passam a gerar problemas para a conclusão do contrato justamente por conta da diferença de mindset.
Na ótica da empresa um lock up period (período mínimo de permanência do empreendedor na startup) pode ser essencial para manter o empreendedor dentro da startup após realizado o investimento. De outro lado, o empreendedor deseja realizar logo sua saída para realmente ter um ganho financeiro com a sua criação.
Do lado do empreendedor, um drag along (uma cláusula que obriga a venda conjunta da participação da empresa caso o empreendedor receba uma proposta de aquisição da startup) pode ser interessante no contrato caso um investidor do tipo venture capital queira comprar 100% da startup. Pior ainda, caso um investidor estratégico queira adquirir o produto ou a startup, provavelmente será do interesse do empreendedor realizar essa venda. No entanto, do lado da empresa investidora, ela não tem o incentivo de aceitar esse tipo de cláusula uma vez que ela deseja ter aquele produto em seu portfolio e também não quer que concorrentes tenham acesso àquela inovação.
Por outro lado, o empreendedor sabe que o poder financeiro da empresa que faz o corporate venture possui é infinitamente superior ao seu. Assim, provavelmente ele possui receio de ser diluído nas rodadas subsequentes por não conseguir acompanhar os aumentos de capital.
Além disso, a empresa que realiza o corporate venture provavelmente tem o ímpeto de possuir algum tipo de decisão nos negócios desenvolvidos pela startup ou, minimamente, um direito de veto sobre determinadas decisões. Na ótica do empreendedor, oferecer este tipo de direito a algum sócio minoritário não é algo desejável.
Ou seja, as diferenças de mindset entre a startup e a empresa acabam refletindo na negociação e na elaboração do contrato de investimento. Por essa razão, os advogados que pretendem negociar este tipo de contrato precisam ter essa noção no momento de sentar à mesa para negociar. Tendo isso como pano de fundo, é importante que os advogados sejam capazes de elaborar documentos e negociar cláusulas que busquem alinhar esses interesses antagônicos para que um projeto de corporate venture seja bem sucedido.
Equipe Molina Advogados