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Já publicamos alguns artigos tratando do polêmico voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), mas esse assunto merece novamente a nossa atenção.
Após diversas críticas a respeito do alcance do fim do voto de desempate no Colegiado, o Ministério da Economia, com a pretensão de disciplinar a matéria e pôr fim às discussões que ainda permanecem sobre o tema, publicou no Diário Oficial da União, no último dia 03 de julho, a Portaria nº 260/2020.
Confira mais um artigo que elaboramos para você e entenda por que esta “novela” ainda está longe de acabar.
O que diz a Portaria?
De acordo com a Portaria, o empate nos julgamentos do CARF será resolvido em favor do contribuinte, conforme previsão do artigo 19-E da Lei nº 10.522/2002, apenas com relação aos processos de exigência de crédito tributário, isto é, aqueles que possuem como objeto auto de infração ou de notificação de lançamento.
Ainda, nos termos do parágrafo 2º do artigo 2º do ato normativo recém-publicado, esse mesmo procedimento deve ser aplicado também para as demandas administrativas que envolvem a exigência de penalidades isoladas, sem a cobrança de tributos federais.
Da mesma forma, o voto de desempate favorável ao contribuinte será utilizado no julgamento de (i) preliminares ou questões judiciais com conteúdo de mérito, como é o caso da decadência e da ilegitimidade passiva do contribuinte, por exemplo; e (ii) embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes ou modificativos.
Por outro lado, (i) os julgamentos envolvendo responsável tributário; (ii) as matérias de natureza processual e aquelas submetidas à conversão em diligência; (iii) os embargos de declaração; e (iv) as demais espécies de processos analisados pela Corte Administrativa, a exemplo do pedido de compensação e restituição, não serão decididos com base na regra benéfica ao contribuinte.
Nestas situações, como dispõe a Portaria, permanece a sistemática prevista no artigo 25, parágrafo 9º do Decreto 70.235/1972, segundo o qual, em caso de empate nas votações do Conselho, o presidente da turma julgadora, conselheiro indicado pela Receita Federal, deverá proferir o voto de qualidade.
A norma é ilegal?
Como demonstramos em artigo divulgado anteriormente (clique aqui para ler), mesmo após a publicação da Lei nº 13.988/2020 e as diversas oposições ao uso do voto de qualidade, o CARF, em contrariedade ao Código Tributário Nacional, especialmente ao princípio do “in dubio pro contribuinte”, continuava empregando este mecanismo em determinados processos administrativos.
Contudo, ainda assim, causou estranheza o fato de uma Portaria do Ministério da Economia, e não do próprio CARF, regulamentar o tema e, sobretudo, restringir a aplicação da Lei Federal ao dispor que a extinção do voto de minerva não abarca todas as demandas de competência do Colegiado.
Em nota divulgada recentemente, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) repudiou o novo ato normativo e esclareceu que “ao limitar a aplicação do artigo 19-E às hipóteses em que indica, a Portaria 260 incorre em violação ao princípio da legalidade, pois invade seara já regulada por lei, reduzindo sua aplicação no âmbito do CARF, além de subtrair a discussão do colegiado quanto à extensão e alcance da norma legal, devolvendo o controle exclusivo da decisão em caso de empate ao Presidente de Turma.”
Além disso, é notório que esse abuso de interpretação do Ministério da Economia, além de prejudicar os contribuintes, certamente afetará o Judiciário com o aumento de demandas visando solucionar definitivamente a questão.
E os Projetos de Decreto Legislativo (PDL) nºs 316/2020 e 320/2020?
O PDL nº 316/2020 foi proposto pelo Deputado Federal Marcelo Ramos Rodrigues com o objetivo de suspender a Portaria nº 260/2020 e tramita em regime de urgência.
Para apresentação do Projeto, o Deputado justificou, corretamente, que “a referida norma exorbita em seu poder de regulamentar e contraria legislação aprovada pelo Congresso Nacional que extinguiu o voto de qualidade nos casos de empate no julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário.”
Esclareceu, ainda, que “o fim do voto de qualidade nos julgamentos dos processos administrativos representou um avanço extremamente importante na construção de um ambiente de maior segurança jurídica em nosso País. A Portaria em questão, por sua vez, representa grande retrocesso pois amplifica a insegurança jurídica, minando a capacidade de atrairmos investimentos e de criarmos uma economia pujante e empreendedora, capaz de gerar riquezas e promover o desenvolvimento.”
Apenso ao Projeto está o PDL nº 320/2020, com a mesma finalidade do primeiro e de autoria do Deputado Federal Newton Cardoso Júnior.
Ambas as propostas chegaram a ser incluídas em pauta, mas foram retiradas pelo primeiro vice-presidente da Câmara dos Deputados, Marcos Pereira. Agora é necessário aguardar a reinclusão em pauta e votação na Casa para posterior análise dos projetos no Senado Federal.
Considerações Finais
Mesmo com a vigência da Portaria nº 260/2020, é importante que os contribuintes saibam da possibilidade de se socorrerem ao Poder Judiciário para tentar reverter eventual decisão desfavorável obtida em julgamento realizado pelo CARF e pautada no voto de qualidade. Nesse sentido, inclusive, destacamos a existência de diversos argumentos suficientes para combater a restrição imposta pela norma publicada pelo Executivo.
Resta, portanto, aguardar a análise pelo Judiciário e esperar que, finalmente, o contribuinte saia vitorioso nessa disputa.
Equipe Tributária do Molina Advogados