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Não é incomum nos depararmos com alguns questionamos de empresas submetidas ao lucro real, acerca do momento em que os créditos decorrentes de decisão judicial transitada em julgado e relativos aos tributos pagos indevidamente devem ser contabilizados e, consequentemente, levados a tributação.
Este tema ganhou ainda mais enfoque depois que o Supremo Tribunal Federal entendeu ser devida a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS¹. Como amplamente divulgado, milhares de empresas foram impactadas positivamente com o julgamento da chamada Tese do Século, que possibilitou a recuperação dos valores recolhidos aos cofres públicos a partir de 15/03/2017 ou nos cinco anos anteriores ao ajuizamento de suas ações judiciais, nas hipóteses em que os respectivos processos foram distribuídos antes dessa data.
Aos poucos, essas ações vêm sendo concluídas e, com o trânsito em julgado das decisões que autorizam a restituição do montante pago em favor da União ou reconhecem o direito à compensação, muitos contribuintes se veem afligidos, por exemplo, com a possibilidade de tributação desta receita pelo IRPJ e pela CSLL, antes mesmo dos valores se tornarem líquidos, certos e disponíveis.
Essa matéria já foi objeto de um artigo nosso (clique aqui para ler), mas, recentemente, a Receita Federal do Brasil divulgou a Solução de Consulta nº 92 – Cosit, envolvendo o assunto. Acompanhe conosco os detalhes desse importante posicionamento do órgão federal.
Tributação dos valores a serem restituídos – Solução de Consulta nº 92 – Cosit de 21/06/2021
A Solução de Consulta analisou os questionamentos de contribuinte submetido ao regime de competência, que impetrou Mandado de Segurança contra ato do Delegado da Receita Federal do Brasil, a fim de afastar a exigência do PIS e da COFINS sobre os valores de ICMS por ela recolhidos.
A segurança foi concedida e a empresa foi cientificada do trânsito em julgado da decisão que reconheceu o direito de (i) exclusão do imposto estadual da base de cálculo das contribuições sociais e (ii) de compensação da quantia indevidamente paga. Com isso, ela procedeu com a apuração do crédito e sua habilitação administrativa para possibilitar o abatimento com débitos próprios de tributos federais, vencidos e vincendos, com base na legislação vigente.
Ao ser questionada com relação à necessidade de tributação dos valores reconhecidos judicialmente pelo IRPJ e CSLL, a Receita Federal reafirmou o seu posicionamento exarado na Solução de Consulta DISIT/SRRF10 nº 233/2007 e no Ato Declaratório Interpretativo SRF nº 25/2003, explicando que a quantia restituída deve ser tributada pelos impostos federais supracitados somente se, em períodos anteriores, tiverem sido computadas como despesas dedutíveis do lucro real e da base de cálculo da CSLL.
Momento do reconhecimento da receita – ADI SRF nº 25/2003
No mais, no que tange ao momento da tributação, vale mencionar que o ADI SRF nº 25/2003, a despeito de tratar do momento da incidência dos tributos sobre os valores decorrentes da ação de repetição de indébito, dispõe que no regime de competência, a receita passa a ser tributável no trânsito em julgado da sentença judicial que já define o valor a ser restituído.
Nas hipóteses em que a sentença condenatória não definir o montante do crédito, a tributação ocorrerá: (i) na data do trânsito em julgado da sentença que julgar os embargos à execução, fundamentados no excesso de execução ou (ii) na data da expedição do precatório, quando a Fazenda Pública deixar de oferecer embargos à execução.
Contudo, reiteramos que a regra imposta pelo órgão federal pode ser combatida pelos contribuintes com sólidos argumentos, especialmente se considerarmos as ações mandamentais, nas quais muitas vezes não há sentença líquida e processo de execução na esfera judicial e os contribuintes apuram os valores a serem restituídos na via administrativa.
Diante disso, como esclarecemos no artigo anterior, não há jurisprudência pacificada sobre o assunto, mas reforçamos a existência de julgados favoráveis aos contribuintes, os quais permitem o adiamento da tributação para o momento da homologação da declaração de compensação, por exemplo.
Impossibilidade de utilização do indébito tributário para abatimento de prejuízo fiscal
Outro questionamento feito pelo contribuinte na Solução de Consulta refere-se à possibilidade da empresa utilizar o indébito tributário reconhecido por força de decisão judicial para abater os prejuízos fiscais acumulados.
De acordo com a Consulente “nos anos em que apurou prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL, as despesas relativas à Contribuição para o PIS/Pasep e à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), integrantes do crédito decorrente de decisão judicial, não foram utilizadas para redução da carga tributária, mas apenas e tão somente para compor o saldo do prejuízo apurado.
A empresa destacou, ainda, que promoveu a dedução dos valores de PIS e COFINS até o limite do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa da CSLL gerados em cada período de competência, da conta de prejuízos acumulados, e questionou se o procedimento por ela adotado estava de acordo com a legislação.
A Receita Federal esclareceu que a resposta para tal dúvida encontra-se prevista também no ADI SRF nº 25/2003, de forma implícita. Segundo o órgão federal, o caput e o parágrafo primeiro do artigo 5º da norma² demonstram que o procedimento acima transcrito não é admitido pela Administração Tributária, já que, se tratando de pessoa jurídica sujeita à apuração da base de cálculo da CSLL e do IRPJ, segundo o regime de competência, o indébito tributário deve ser tratado como receita tributável no período em que ocorrer sua disponibilidade jurídica.
Assim, nas palavras da RFB, “se a receita é tributável, por evidente, ela não pode ser excluída do lucro líquido para efeito de apuração do lucro real e do resultado ajustado.”
Este é um outro ponto da Solução de Consulta que nos causa estranheza. Nas hipóteses de compensação de créditos previdenciários, por exemplo, decorrentes de decisão judicial transitada em julgado, a Receita Federal possui diversos posicionamentos acerca da necessidade de retificação de todas as GFIPS correspondentes às competências geradoras do crédito e, consequentemente, recomposição da base de cálculo de tais tributos³. Nesse caso, seriam “dois pesos e duas medidas”?
Considerações finais
Percebe-se que, não obstante o encerramento da discussão sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS no Supremo Tribunal Federal, o assunto ainda é polêmico e vem gerando diversos desdobramentos.
Diante disso, é provável que muitas outras demandas vinculadas ao tema ainda sejam ajuizadas, a fim de confirmar, por exemplo, o momento correto da incidência do IRPJ e da CSLL sobre tais receitas, bem como a possibilidade de recomposição da base de cálculo dos tributos em questão, a fim de diminuir eventual saldo de prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa da CSLL, sem a tributação dos valores acumulados indevidamente recolhidos.
¹ Recurso Extraordinário nº 574.706 – Tema 69 da Repercussão Geral
² Art. 5º Pelo regime de competência, o indébito passa a ser receita tributável do IRPJ e da CSLL no trânsito em julgado da sentença judicial que já define o valor a ser restituído.
§ 1º No caso de a sentença condenatória não definir o valor a ser restituído, o indébito passa a ser receita tributável pelo IRPJ e pela CSLL:
(…)
³ Soluções de Consulta da Receita Federal nºs 132/2016, 77/2018 e Solução de Consulta Disit/Srrf08 nº 8001/20.