OS RISCOS CONSUMERISTAS DAS PLATAFORMAS DE INTERMEDIAÇÃO

Compartilhe

301 segundos

O mercado e as relações de consumo tiveram grande impacto com o aumento da economia digital e, consequentemente, das plataformas de intermediação. Isso porque a compra em lojas físicas, nas quais ficam mais evidentes as figuras do fornecedor e consumidor do produto e/ou serviço, estão sendo substituídas pelas compras online.

Nas compras online, realizadas por meio de plataformas digitais, também conhecidas como marketplaces, nem sempre as figuras do fornecedor e comerciante estão bem definidas, o que pode gerar riscos para o consumidor e responsabilidades para as plataformas.

As plataformas de marketplace atuam como intermediadoras de negócios, seus serviços são prestados por meio de sistemas eletrônicos de automação e inteligência artificial. É importante destacar, ainda, que as plataformas podem adotar a modalidade B2B, ou seja, sem venda direta para pessoa física, abrangendo apenas negociações entre empresas, ou B2C, com venda direta para pessoas físicas, com foco no consumidor final.

Independentemente da modalidade adotada, as plataformas poderão ser responsabilizadas por eventuais vícios e defeitos nos produtos vendidos por terceiros, nos termos da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (“Código de Defesa do Consumidor”), e da legislação aplicável.

A legislação brasileira prevê uma proteção especial para o consumidor, tendo em vista a sua posição de vulnerabilidade na relação com o fornecedor, estabelecendo normas e princípios que regulam a tutela desse sujeito especial de direitos. Assim, são garantidos direitos ao consumidor e obrigações ao fornecedor, sempre que houver uma relação de consumo.

Para qualificação dos compradores das plataformas digitais como consumidores, deverá ser verificado se os produtos comprados serão destinados para o emprego do produto ou serviço para fim profissional (por exemplo, para uso no processo de industrialização) ou para uso pessoal, bem como deverá ser verificada a vulnerabilidade do comprador frente ao fornecedor.

Se os produtos forem destinados para consumo pessoal (incluindo as hipóteses de produtos não utilizados no processo de produção) do comprador ou se for identificada a sua vulnerabilidade, é provável que o comprador seja considerado como “consumidor” nos termos do Código de Defesa do Consumidor, devendo as plataformas observar as regras e princípios de referido Diploma Legal.

O conceito de fornecedor é trazido pelo artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor¹, é um conceito amplo que abrange todos os participantes da cadeia de fornecimento. O rol de atividades previstas no artigo em comento é exemplificativo, ou seja, comporta outras atividades desenvolvidas na cadeia de fornecimento.

É exigido do fornecedor o exercício da atividade profissional do comércio, de forma habitual (reiterada) e lucrativa, que vise uma vantagem econômica. Assim, não podem ser consideradas fornecedoras as pessoas que praticam atos isolados, de forma não habitual (por exemplo, a venda de carro próprio por anúncios na internet), ademais, o negócio praticado pela pessoa deve ter relação com sua atividade econômica. Para caracterização do fornecedor, é necessário, ainda, que a atividade seja desenvolvida no mercado de consumo.

Uma vez reconhecida a caracterização do consumidor e fornecedor, conforme acima exposto, as plataformas digitais também poderão ser qualificadas como fornecedoras, justamente por serem parte da cadeia de produção², ressalte-se que o conceito de fornecedor é amplo. Nestes casos, as plataformas estarão sujeitas às obrigações e responsabilidades previstas no Código de Defesa do Consumidor.

O fornecedor de produtos e serviços tem o dever de qualidade, por meio do qual só poderá disponibilizar no mercado de consumo produtos e serviços seguros, que ofereçam segurança que os consumidores esperam, ou seja, sem defeitos, e adequados, que sirvam ao fim a que se destinam e sem perder prematuramente a sua utilidade, ou seja, sem vícios. Sempre que for verificado defeito ou vício no produto ou serviço, o fornecedor será responsabilizado.

Caso seja caracterizada a relação consumerista e seja identificado defeito ou vício nos produtos e/ou serviços disponibilizados na plataforma, esta poderá ser responsabilizada, de forma solidária ou subsidiária, ainda que tenha atuado apenas como intermediadora.

A responsabilidade pelo vício ou defeito em produto ou serviço é objetiva, ou seja, independe da culpa do agente e decorre do risco da atividade. Em determinados casos previstos em lei, a responsabilidade poderá ser afastada, mas destacamos a necessidade de o fornecedor comprovar as situações que afastam a responsabilidade.

Ressaltamos, ainda, que os tribunais pátrios têm firmado entendimento no sentido de que as plataformas de intermediação, ao controlarem os cadastros de fornecedores e criarem ambiente para veiculação de anúncios e vendas de produtos, devem ser responsabilizadas por vícios e defeitos de produtos e serviços, bem como pelos anúncios divulgados na plataforma. Nestes casos, o entendimento é de que a plataforma faz parte da cadeia de consumo e, portanto, a responsabilidade é solidária.³

Em vista da possibilidade de ser caracterizada a relação de consumo, o que, consequentemente, poderá gerar responsabilidade consumerista das plataformas digitais, é essencial que sejam adotadas medidas para minimizar os riscos, tais como: (i) adoção de critérios rigorosos para o cadastro de fornecedores na plataforma; (ii) termos de uso dos serviços oferecidos na plataforma; (iii) políticas de cancelamentos, reembolso e devoluções de produtos; (iv) criação de canal de comunicação com o comprador, dentre outras.

Continue nos acompanhando e fique por dentro das novidades sobre o tema.

¹ Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
² REsp 1880344/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/03/2021, DJe 11/03/2021.
³ REsp 997.993/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 21/06/2012, DJe 06/08/2012.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

ASSINE A NOSSA NEWSLETTER PARA FICAR POR DENTRO DAS NOVIDADES