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Em recente decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), foi reconhecida a possibilidade de que os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica atinjam os fundos de investimento. Veja, em nosso artigo, maiores informações sobre o tema.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), em julgamento do Recurso Especial nº 1965982/SP[1], reconheceu que, uma vez comprovado o abuso de direito, caracterizado pelo desvio de finalidade e/ou a confusão patrimonial, o fundo de investimento pode sofrer os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica.
Em seu voto, o Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cuevas ressaltou que, conforme as normas aplicáveis, os fundos de investimento são constituídos na forma de condomínio aberto ou fechado. Não obstante, não são todas as regras aplicáveis aos condomínios que podem ser aplicadas indistintamente aos fundos de investimento, uma vez que, no caso, também são aplicáveis as normas da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”).
Ademais, o Relator reconheceu que apesar de serem destituídos de personalidade jurídica, aos fundos de investimento são imputados direitos e obrigações e, ainda que exerçam suas atividades por intermédio de administrador/gestor, podem ser titulares, em nome próprio, de tais direitos e obrigações.
O Ministro Villas Bôas Cuevas alega em seu voto que “o fato de ser o FIP [Fundos de Investimento em Participações] constituído sob a forma de condomínio e de não possuir personalidade jurídica não é capaz de impedir, por si só, a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica em caso de comprovado abuso de direito por desvio de finalidade ou confusão patrimonial”[2].
Neste ponto, o Ministro destaca que as prerrogativas previstas no artigo 1314 do Código Civil Brasileiro[3], conferidas aos condôminos, não são conferidas aos cotistas dos fundos de investimento. Isso porque os cotistas possuem somente direitos referentes à sua participação no fundo (fração ideal do todo), não desfrutando plenamente dos direitos sobre os ativos do fundo.
Diante dos esclarecimentos acima, Villa Bôas Cuevas esclarece que, em tese, o patrimônio comum do fundo de investimento não poderia sofrer constrição judicial por dívida de apenas um cotista. No entanto, tal regra é aplicável apenas se forem observadas circunstâncias normais.
No caso do REsp 1965982/SP, foi verificada fraude na constituição do fundo, que foi criado para encobrir ilegalidades e ocultar o patrimônio de empresas de um mesmo grupo econômico. Nestes casos, o patrimônio do fundo poderá ser utilizado para responder por dívidas de cotistas, desde que não atinja as cotas e participação de cotistas não envolvidos nos atos fraudulentos.
A Terceira Turma do STJ, seguindo o voto do Relator, por unanimidade, reconheceu a possibilidade de fundos de investimento sofrerem os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica. Conforme acima mencionado, apesar de não terem personalidade jurídica, os fundos de investimento são titulares de direitos e obrigações e podem ser constituídos ou utilizados de forma fraudulenta pelos cotistas, o que justifica a aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica.
Continue nos acompanhando e fique por dentro das novidades sobre o tema.
[1] REsp 1965982 /SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/04/2022, DJe 08/04/2022, disponível em <https://processo.stj.jus.br/processo/julgamento/eletronico/documento/mediado/?documento_tipo=integra&documento_sequencial=149877721®istro_numero=202102191479&peticao_numero=&publicacao_data=20220408&formato=PDF>.
[2] [2] REsp 1965982 /SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/04/2022, DJe 08/04/2022, pg. 17 e 18.
[3] “Art. 1.314. Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la.
Parágrafo único. Nenhum dos condôminos pode alterar a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a estranhos, sem o consenso dos outros.”