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Cláusula de recompra de quotas/ações nos contratos de vesting
O Plano de Outorga de Opção de Compra de Quotas/Ações, também conhecido como Plano de Stock Option ou Partnership, é um excelente mecanismo de atração e retenção de talentos, bem como para o alinhamento de interesses dos sócios e colaboradores, o que contribui para o crescimento da sociedade.
Por meio do Plano, é concedido um percentual do capital social da sociedade aos seus colaboradores que poderão, no futuro e após determinado período e/ou após o cumprimento de metas pré-definidas, comprar as quotas/ações da sociedade.
Os colaboradores que serão beneficiados com o Plano deverão celebrar um Contrato de Opção de Compra de Quotas/Ações (ou Contrato de Vesting) com a sociedade, no qual a sociedade se comprometerá com a transferência das quotas/ações ao colaborador quando cumpridos todos os requisitos estabelecidos e o colaborador estiver apto e efetivamente exercer a opção de compra.
Com o exercício da opção de compra pelo colaborador, esse passará a ser sócio da sociedade, o que poderá resultar em questões societárias, tais como conflitos de interesses, discussões entre sócios, problemas para retirada/saída de sócios minoritários. Tais conflitos poderão impactar o crescimento e operação da sociedade, na medida em que poderá travar eventuais deliberações que dependam da aprovação dos sócios, ou mesmo reestruturações societárias, obtenção de investimentos, dentre outros fatores.
Nesse cenário, a opção de recompra das quotas/ações pela sociedade (ou por pessoa por essa indicada)[1] é um mecanismo a ser avaliado para a proteção dos interesses da própria sociedade e com objetivo de amenizar eventuais conflitos societários. Assim, a sociedade teria o direito de recomprar as quotas/ações adquiridas pelo colaborador em virtude do Plano e o colaborador ficaria obrigado a vender as quotas/ações para a sociedade.
A função da opção de recompra, nesses casos, seria a retirada do sócio da sociedade ou, eventualmente, a redução da sua participação no capital social, de forma que reduziria seu poder de controle da sociedade.
Nos termos da legislação brasileira, a retirada dos sócios, em sociedades empresárias limitadas, seria permitida na ocorrência de falta grave pelo sócio, na hipótese de incapacidade superveniente ou em virtude de atos de inegável gravidade que coloquem em risco a continuidade da sociedade[2].
Para a exclusão judicial de sócio é necessário o ajuizamento de ação, por iniciativa da maioria dos demais sócios, fundamentada na falta grave cometida por aquele cuja exclusão é pretendida no cumprimento de suas obrigações ou pela sua incapacidade superveniente. A exclusão ocorrerá após o ajuizamento da ação, nos termos da sentença judicial.
Já para a exclusão extrajudicial, é necessária a previsão no contrato social da sociedade a possibilidade de exclusão por justa causa. A maioria dos demais sócios (representando mais da metade do capital social) poderá deliberar a exclusão do sócio em reunião ou assembleia convocada especialmente para esse fim.
Em caso de resolução da sociedade em relação a um dos sócios, as quotas por ele detidas serão liquidadas com base na situação patrimonial da sociedade, conforme balanço especialmente levantado, salvo disposição em contrário no contrato social.
Verificada a dinâmica para a exclusão de sócio, a opção de recompra das quotas/ações pela sociedade aparece, a princípio, como uma alternativa para agilizar a alteração do quadro de sócios quando verificado um conflito societário. Ademais, poderá ser determinado valor diverso do valor patrimonial das quotas, desde que os critérios para a definição do preço sejam claros, lógicos, transparentes e objetivos, bem como sejam passíveis de aferição matemática.
No entanto, pelo fato de a exclusão de sócio obedecer às normas de ordem pública, deve-se verificar se, pela autonomia da vontade, seria permitido às partes envolvidas utilizar a opção de compra de quotas/ações com a função de retirada do sócio.
Note que a opção de recompra como mecanismo para exclusão de sócio só irá ultrapassar os limites da autonomia da vontade caso o exercício da opção seja potestativo, ou seja, independentemente de qualquer hipótese concreta. Assim, para evitar discussões judiciais e, eventualmente, a invalidade da cláusula por seu caráter leonino, é essencial que a recompra das quotas/ações possa ser exercida em hipóteses previamente definidas.
Para determinar quais as hipóteses de recompra das quotas/ações, deve-se analisar a estrutura da sociedade, o que é relevante para os interesses sociais e como o sócio pode contribuir para os fins sociais.
Ressaltamos que é importante definir um lapso temporal para a referida recompra das quotas/ações pela sociedade. Por exemplo, determinar que a opção de recompra será vigente por prazo indeterminado não nos parece a melhor alternativa. Isso porque, embora parte da doutrina defenda que pactos parassociais só possam ser resilidos de forma unilateral havendo justa causa, a regra geral é que acordos firmados por prazo indeterminado podem ser resilidos unilateralmente a qualquer momento, não podendo a resilição unilateral ficar a critério de justa causa.
Dessa forma, é essencial que seja definido um prazo razoável, de acordo com a função do contrato, para que a sociedade exerça a opção de recompra das quotas/ações do colaborador beneficiado. Do contrário, a cláusula poderá ser considerada ilegal e, nestes casos, a sociedade não conseguirá exercer a opção de recompra das quotas/ações.
Em suma, a cláusula de recompra de quotas/ações pela sociedade é um excelente mecanismo de proteção da própria sociedade nos casos de aquisição de quotas/ações por colaboradores em virtude de Planos de Stock Option. Para evitar qualquer questionamento, a cláusula deverá ser detalhada, com hipóteses de recompra definidas de acordo com as particularidades da sociedade, bem como prazo determinado.
Continue nos acompanhando e fique por dentro das novidades sobre o tema.
Equipe de Consultoria do Molina Advogados
[1] Caso a sociedade não tenha interesse ou reserva de lucro para exercer a recompra, a opção de recompra poderá ser exercida pelos sócios da sociedade ou por terceiro por essa indicada. Tal possibilidade deverá estar prevista nos documentos celebrados entre as partes.
[2] Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil Brasileiro):
Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente.
Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa.
Parágrafo único. Ressalvado o caso em que haja apenas dois sócios na sociedade, a exclusão de um sócio somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa. (Redação dada pela Lei nº 13.792, de 2019).