293 segundos
Conforme abordamos em nosso artigo anterior (clique aqui), a declaração de inidoneidade é uma poderosa ferramenta, utilizada pelas Fazendas Estaduais, cujo objetivo é, principalmente, coibir que o contribuinte do ICMS, em “situação irregular” (aos olhos do fisco) continue emitindo notas fiscais e realizando operações.
Ocorre que, a consequência não afeta somente a empresa emitente, o problema irá refletir também nos contribuintes que realizaram negócios com ela. No processo de inidoneidade, por exemplo, os efeitos da declaração de irregularidade retroagem, por muitas vezes, à data da emissão das notas fiscais consideradas “frias”.
Ou seja, além de impedir que um contribuinte emita notas fiscais, a declaração de inidoneidade pode considerar como “inválidas” as notas emitidas em operações anteriores, até mesmo para fins de crédito de ICMS.
- A INTERPRETAÇÃO DO FISCO ESTADUAL
No Estado de São Paulo, a legislação considera, nos termos do artigo 184 do RICMS, desacompanhada de documento fiscal a operação ou prestação acobertadas por documento inábil.
Nesse sentido, mesmo que, no momento da operação, toda a documentação fiscal tenha acompanhado “legitimamente” a mercadoria, os efeitos da declaração de inidoneidade irão retroagir à época em que o Fisco entender que a empresa estava irregular. A temática ganha força na medida em que os documentos, emitidos pelo contribuinte declarado inidôneo, foram utilizados no creditamento do ICMS na operação subsequente, ou seja, o adquirente da mercadoria recebeu a nota fiscal com destaque do ICMS e, na revenda da mesma, se creditou do montante do ICMS incidente na operação anterior.
Se a nota fiscal foi declarada, mesmo que de forma retroativa, inidônea, logo o crédito tomado será considerado, pelo fisco, indevido e, provavelmente, a Fazenda lavrará um Auto de Infração objetivando a glosa (anulação) desses créditos.
Assim, a discussão está associada à responsabilização do adquirente da mercadoria quando da declaração de inidoneidade das notas fiscais emitidas pela empresa vendedora. Importante destacar esse conceito: “situação regular” está definida no artigo 59 da mesma legislação como sendo “a do contribuinte que, à data da operação ou prestação, esteja inscrito na repartição fiscal competente, se encontre em atividade no local indicado e possibilite a comprovação da autenticidade dos demais dados cadastrais apontados ao fisco.”
- PODE O FISCO GLOSAR O CRÉDITO?
Mas afinal, o crédito utilizado pelo adquirente da mercadoria é ou não devido? Existem muitos argumentos, tanto favorecendo o contribuinte quanto o fisco. Um dos mais importantes, utilizado pelas empresas, aborda o fato da declaração de inidoneidade ser posterior à época da emissão dos documentos, não podendo retroagir e afetar a operação já realizada, em obediência ao princípio da publicidade.
Há também a possibilidade de sustentar a validade do crédito, sob o prisma de não ser o contribuinte obrigado a fiscalizar o seu fornecedor por ser esta uma função do Estado. O princípio da não-cumulatividade também auxilia os contribuintes nessa discussão, pois se houve incidência do ICMS na operação anterior, há direito ao crédito na operação subsequente.
No entanto, muitas vezes o contribuinte não logra ao êxito em comprovar se houve ou não recolhimento do imposto na operação anterior (não entraremos na seara do imposto devido x imposto pago), restando a ele, então, comprovar a ocorrência da operação e sua boa-fé.
- SUMULA 509 DO STJ: BOA-FÉ!
Referida discussão bateu às portas do judiciário e o Superior Tribunal de Justiça assim julgou: “É lícito ao comerciante de boa-fé aproveitar os créditos de ICMS decorrentes de nota fiscal posteriormente declarada inidônea, quando demonstrada a veracidade da compra e venda.”
Verificamos bom senso na referida decisão judicial já que muitas empresas estão de boa-fé, não havendo indícios no passado de eventual irregularidade na operação.
- ORIENTAÇÃO AOS CONTRIBUINTES
É de suma importância que o contribuinte tenha em mãos o seu “kit boa-fé” no caso de sofrer uma fiscalização. Isso porque o adquirente da mercadoria precisará demonstrar ao fisco que estava de boa-fé e que adotou todas as medidas cabíveis, à época dos fatos, quando realizou negócios com a outra empresa.
Esse kit nada mais é do que o conjunto de documentos capazes de comprovar (i) a boa-fé; e (ii) a veracidade da compra e venda. Desta feita, resta ao contribuinte demonstrar a veracidade da compra e venda por ele realizada para ter seus créditos de ICMS glosados pelo fisco.
Não existe uma lista exata de documentos, prevista na legislação, para auxiliar na construção desse quadro probatório. Isso exige, então, que contribuinte monte seu próprio kit (conjunto de provas), seguindo a jurisprudência dominante no assunto.
Para auxiliá-los, citamos alguns documentos que comprovam a boa-fé e a veracidade das operações de compra e venda: cópias das ordens de compra, e-mails trocados com a empresa, comprovante de pagamento, Sintegra da época, notas fiscais de saída das mercadorias, livros registro do contribuinte contendo as NF’s escrituradas, ticket de transporte, etc.
A apresentação desses documentos é capaz de invalidar a glosa de créditos ICMS decorrente da entrada de mercadorias provenientes de documentação posteriormente declarada inidônea?
Sim, uma vez que comprovada a boa-fé do contribuinte e a veracidade da operação! |
A Súmula 509 veio em uma boa hora, ajudando o contribuinte “de boa-fé” a permanecer com seu crédito de ICMS, quando demonstrada a veracidade da operação. Referido entendimento se estende também para os Tribunais Administrativos, trazendo segurança para operações realizadas com empresas que venham a ter notas fiscais declaradas inidôneas.
Equipe Tributária do Molina Advogados