CARF ENTENDE QUE RECEITAS DECORRENTES DE ANTECIPAÇÃO DE RECEBÍVEIS DE VENDAS ESTÃO SUJEITAS À ALÍQUOTA GERAL DO PIS E DA COFINS

Getting your Trinity Audio player ready...
Compartilhe

477 segundos

Novo tema levado a julgamento pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) determinou que as receitas provenientes da Antecipação de Recebíveis de Vendas (ARV) devem estar sujeitas à alíquota geral do PIS e da Cofins. A decisão foi tomada pelo voto de qualidade e analisou a classificação da natureza (financeira ou operacional) da operação.

Veja abaixo o resumo que preparamos para você com os principais pontos sobre mais essa discussão.

Da antecipação de recebíveis de vendas

A antecipação de recebíveis de vendas (ARV) é uma ferramenta utilizada pelas empresas para adiantar pagamentos que seriam efetuados no futuro pelos seus clientes. A ARV é comumente usada nas operações de vendas a prazo, ou seja, parceladas ou após um certo período.

A antecipação é realizada por uma instituição financeira, em que realiza o pagamento à empresa de um valor menor do que o total da venda (deságio), descontando taxas de juros e encargos financeiros. A instituição passa, então, a assumir o direito creditório envolvido na operação, se tornando a credora dos valores a serem pagos pelos clientes da empresa.

Essa prática é comum em empresas que precisam de liquidez imediata para financiar suas operações, pagar fornecedores ou investir em novos projetos, mas não querem esperar até o vencimento das parcelas.

Contexto da discussão

No caso em questão, envolveu a cobrança referente à tributação do PIS e da Cofins sobre as receitas advindas da ARV entre os anos de 2014 e 2015. e o ponto central da discussão foi a natureza da antecipação.

Para a fiscalização, a natureza da operação seria a prestação de serviço de factoring. Nesta operação, uma empresa especializada, chamada de fator, compra os recebíveis de outra empresa, a cedente, com o objetivo de antecipar esses valores.

A prestação de serviço de factoring é uma operação classificada como fomento mercantil, e, portanto, a receita gerada por essa atividade é considerada uma receita operacional. Nestes casos, as receitas de factoring estão sujeitas à alíquota geral de PIS e Cofins, que são 1,65% e 7,6% respectivamente, no regime de operação não cumulativo.

Por outro lado, o contribuinte apontou que a atividade com recebíveis não é típica da empresa, e, portanto, se trataria de atividade de natureza financeira (e não operacional), assim como empréstimos, créditos, financiamentos, arrendamentos financeiros, entre outros serviços típicos oferecidos por bancos e financeiras.

Para essas atividades, a tributação é diferenciada, sendo a alíquota do PIS de 0,65% e a alíquota da Cofins de 4%, no regime não cumulativo.

Além disso, corroborado pela ideia de que a operação de ARV não é típica da empresa, foi levado à discussão a aplicação da alíquota zero prevista pelos Decretos nº 5.164/2004 e 5.442/2005 que abarcam as receitas financeiras estranhas à atividade empresarial.

Entretanto, no colegiado, venceu o entendimento de que a atividade desenvolvida pela companhia estaria sujeita à alíquota geral do PIS e da Cofins, conforme destacado a seguir.

Fundamentos da discussão

O julgamento foi iniciado em julho, mas foi suspenso por conta de um pedido de vistas após o relator, o conselheiro José Renato Pereira de Deus, votar pela nulidade do auto de infração. Somente em setembro a discussão foi retomada, sendo afastada, pela maioria do colegiado, a preliminar de nulidade.

Na discussão do mérito, o relator defendeu a tese de que receita com os recebíveis é financeira, “uma vez que resulta da remuneração pelo adiantamento de recursos, similar aos juros cobrados em operação de crédito”. Ainda, pontuou que a antecipação não pode ser equiparada ao serviço de factoring, já que a estrutura jurídica, a operacionalização e regulamentação são distintas.

Em sua fundamentação, o relator realizou um comparativo entre as receitas obtidas pela prestação de serviço das administradoras de cartões e as receitas obtidas através do ARV, e explicou que suas diferenças decorrem da primeira ter natureza de serviço, enquanto a outra possui características financeiras.

Neste sentido, explicou que a atividade de factoring envolve “a prestação de serviços conjugada com a aquisição de créditos oriundos de vendas mercantis a prazo”. Já na ARV, não haveria prestação de serviço, tampouco cessão de créditos.

Isto porque, para que haja prestação de serviço, deverá haver uma prestação de fazer, sendo que na antecipação dos recebíveis não há obrigação de fazer, apenas a obrigação de dar. Sendo assim, a ARV não envolve a prestação de serviço e, portanto, não incorre na atividade de factoring.

Não obstante, o relator defendeu a tese de que a operação de ARV não é exclusiva de instituições financeiras, sendo possível também às instituições de pagamentos autorizadas e regulamentadas pelo Banco Central realizarem.

Sendo assim, seu voto era a favor do provimento do recurso, sendo acompanhado pelas conselheiras Marina Righi Rodrigues e Francisca das Chagas Lemos. No entanto, restou vencido.

O voto vencedor foi redigido pelo conselheiro Lázaro Antônio Souza Soares, onde, acompanhado dos conselheiros Mário Sérgio Martinez Piccini e Marcos Antônio Borges, defendeu a tese de que a operação é caracterizada como compra de direito creditório, de fomento mercantil e, portanto, de natureza operacional.

Para tanto, o conselheiro trouxe à tona legislações tributárias que identificam as receitas financeiras. O Decreto-lei nº 1598/77, em seu artigo 17, §1º, “a”, determina que os descontos dos títulos de crédito fazem parte de tais receitas. Além disso, o artigo 9º da Lei nº 9718/98 aponta, também, que as variações monetárias dos direitos de crédito e das obrigações do contribuinte fazem parte do mesmo rol.

Por outro lado, ainda que a receita obtida na operação de ARV se trate de descontos e que, de fato, envolve um título de crédito, o conselheiro explica que o deságio da operação tem natureza completamente distinta do desconto financeiro tratado nas legislações acima.

Isso porque, os “descontos dos títulos de crédito” tratado no Decreto-Lei nº 1598/77, na verdade, trata de situações nas quais “o devedor entra em acordo com o credor para pagar antecipadamente uma dívida com vencimento futuro […], mediante um desconto no valor de face”. Nesta negociação, o devedor faz o pagamento de sua dívida com desconto, e, portanto, dispõe de uma receita financeira. Já o credor, recebe o pagamento com deságio, tendo assim uma despesa financeira.

Por outro lado, na ARV, não há quitação de dívida por parte da empresa, mas sim o adiantamento de suas receitas, o que caracterizaria uma “relação de fomento mercantil, mediante a contratação de um serviço”.

Além disso, o redator apontou que a operação para ser considerada uma atividade de factoring, deve ser praticada de maneira contínua: “empresas comerciais, atacadistas ou industriais não oferecem, de forma contínua, um serviço de “antecipação de recebíveis”. Pode apenas ocorrer, eventualmente, uma negociação para o pagamento de um título de crédito com desconto”.

Ocorre que, da análise do caso, verificou-se que a empresa dispunha do serviço em seu site e que a atividade constava, inclusive, em seu objeto social. Ou seja, trata-se de atividade praticada de forma contínua, habitual e profissionalizada pela empresa, deixando clara e evidente tratar-se de receita operacional e, ainda, afastando os fundamentos para aplicação da alíquota zero.

De acordo com os documentos apresentados pela empresa, o valor em disputa girava em torno de R$ 850 milhões.

Considerações finais

O tema em questão aborda conceitos aprofundados em que tanto o contribuinte quanto o fisco apresentaram teses sustentáveis. No entanto, a decisão final do Conselho parece ser a mais acertada.

Da análise das alegações apresentadas pelas partes, bem como dos votos apresentados pelos conselheiros, foi possível extrair a clara cessão do direito creditório na antecipação dos recebíveis, uma vez que, recebendo o deságio da operação, a empresa deixa de ser a credora do pagamento de seu cliente, repassando tal posição à instituição financeira que realizou a antecipação dos pagamentos. Aqui, a operação alinha-se com o conceito de factoring, ainda que não haja obrigação de fazer.

Não obstante, no voto vencedor, é possível notar que a empresa disponibilizava o serviço de antecipação de crédito em seu site, o que comprovava realizar a atividade de maneira típica e habitual, corroborando ainda mais para o entendimento de que as receitas advindas da operação são receitas operacionais.

A matéria é nova no Carf e, embora a decisão possa ser revista, ela reflete a tendência do Conselho em futuras discussões em casos similares. Neste sentido, destaca-se a importância de que as empresas estejam sempre atualizadas sobre as novidades do mundo jurídico-tributário para que possam mensurar os riscos de suas operações e antecipar possíveis discussões.

A equipe do Molina Advogados está à disposição para prestar maiores esclarecimentos sobre o tema. Continue nos seguindo e fique por dentro de todas as novidades tributárias.

Equipe Tributária do Molina Advogados

ASSINE A NOSSA NEWSLETTER PARA FICAR POR DENTRO DAS NOVIDADES